Antônio Carlos Marques

ANTÔNIO CARLOS MARQUES – UMA PARCERIA DE 40 ANOS

Em 1977, ao apreciar um ensaio de um terno de congada, ouvia-se claramente, entre o rufar dos tambores, a voz de um jovem cidadão, que reclamava abertamente da falta de apoio da Prefeitura para as manifestações culturais de Uberaba.

Foi meu primeiro contato com Antônio Carlos Marques. Gostei de suas reclamações e explanações, nas quais se percebiam o seu amor e entusiasmo para com o nosso folclore. Nascia aí um relacionamento que perdurou por toda a sua vida.

Em 1978, fizemos a primeira parceria ao participarmos da diretoria do Instituto de Folclore do Brasil Central, criado por Edelweis Teixeira em 1962. Antônio Carlos Marques nunca mais se afastou da área cultural.

Em 1979, convidei-o para se integrar a um grupo composto de idealistas, representante de diversos segmentos culturais com o firme propósito de reivindicar junto ao prefeito Silvério Cartafina Filho a criação de uma entidade pública – Secretaria de Cultura ou Fundação Cultural – para que o Poder Público tivesse meios legais de valorizar nossos artistas, fomentar e difundir nossas raízes culturais.

Juntos a outros amigos, como Jorge Alberto Nabut, Edson Prata, Décio Bragança, Henri Brandão, Demilton Dib, Beth Dorça, Maria Antonieta Borges, Erwin Puhler, Beethoven Teixeira, atingimos nossos objetivos com a publicação em 11 de junho de 1981, da portaria n. 408, na qual o prefeito nomeou uma comissão para a elaboração de um estatuto para a criação da Fundação Cultural de Uberaba.

Essa comissão, formada por Edson Gonçalves Prata, Gilberto de Andrade Rezende, Walter César Brito Dantas, Décio Bragança e o secretário municipal de Educação, professor Antônio Mendonça Bilharinho, realizou seu trabalho em 40 dias e, pela portaria 703 de 21 de julho de 1981, o prefeito aprovou os estatutos da nova entidade.

Todavia, somente em 18 de agosto de 1982 é que foi nomeado o primeiro conselho da Fundação, através da portaria 901, nos termos da lei municipal de n. 3.130 aprovada em 09 de junho de 1981, na qual constava como suplente do Conselho Deliberativo, Antônio Carlos Marques.

Em sua participação na Fundação Cultural, teve diversas funções como de conselheiro, diretor do Circo do Povo, diretor de Cultura e, finalmente, presidente no governo de Paulo Piau. Sempre foi uma referência em cultura afro-brasileira.

Nossa parceria de 40 anos, assentada na amizade e idealismo em comum, possibilitou a implantação de dezenas de projetos culturais voltadas para a valorização de nossos artistas e resgate de nossas raízes culturais. Podem ser destacadas:

a gravação em 1983 na Casa do Folclore de um LP denominado “Cantos e Danças de Uberaba” com a participação de grupos de catira, folias de reis, congadas e moçambiques. Os LPs foram adquiridos por nós da Fundação Cultural para distribuição entre a comunidade;

a gravação em 1993 de 12 grupos de folias de reis realizado na Casa do Folclore para que Roberto Corrêa, compositor, violeiro e professor de viola, pudesse pautar a diversidade das cantorias de reis, entre outras, “O Nascimento de Jesus”, “Visita ao Presépio”, “Anunciação” e “Viagem dos Reis Magos”, e editar um livro de partituras para que, no futuro, se tomasse conhecimento de como eram entoadas as melodias das companhias de reis de Uberaba naquela época;

a sua entusiasmada participação, a partir de 1983, no programa “Recanto do Folclore”, que lançamos na década de 1970 com o apoio de Toninho e Marieta, Edinho, Paulo Silva, e outros. Ele era apresentado durante a Exposição, no Parque Fernando Costa. Esse programa contou também com parceria do SESC nas pessoas de seus diretores, Izilda Ribeiro e Antônio Zélio. Nessas apresentações, com a impecável locução de Eustáquio Rocha e a câmera nas mãos do mestre José Maria dos Reis (Alemão), desfilavam catira, folia de reis, congadas, moçambiques, violeiros e outras manifestações culturais. Posteriormente, esse programa na ABCZ passou a ter o nome de “Show Regional”;

a inusitada apresentação na década de 1990, na Igreja Matriz, de grupos de congada e Moçambique, que teve o apoio de Silvia Andrade Borba, nossa tia, incansável colaboradora da Catedral. Por sugestão de Antônio Carlos, a Fundação Cultural patrocinou roupagem nova para todos os grupos participantes do evento;

parceria na criação da Escola de Viola “Gaspar Corrêa”, que, inicialmente foi comandada por Claudionor da Silveira e, posteriormente, por José Romano e Nicodemos de Oliveira e que, ao longo de mais de três décadas, proporcionou a milhares de pessoas, a oportunidade de aprender os segredos da viola;

participação nos festivais e encontros de folias de reis e em dezenas de festivais de violas, que aconteceram nestes 40 anos na TV Uberaba, Circo do Povo, Uberaba Tênis Club, SESC, Casa do Folclore, Casa do Rosário, Igreja das Almas e paróquia da Igreja de Nossa Senhora da Abadia;

apoio na Escola de Catira pela qual passaram Fátima Cury, Sinhô Borges e o inesquecível compositor, violeiro e cantador, Manoel Teles;

não se pode esquecer da sua dedicação para tornar possível, através da Fundação Cultural e em parceria com a Associação Cultural Casa do Folclore, as apresentações de grandes violeiros como Renato de Andrade, Roberto Corrêa, Alexandre Guti Saad, Elomar Figueira de Melo, Dércio Marques e sua irmã Dorothy, Saulo Laranjeira, Inezita Barroso, Chico Lobo, Pena Branca, e as duplas Pedro Bento e Zé da Estrada, Carreiro e Carreirinho, Liu e Léo e muitas outras expressões artísticas em memoráveis cantorias e concertos de viola na Casa do Folclore, na sala “Cecília Palmério”, no Jockey Clube, na Concha Acústica, no Teatro SESI, no TEU e no Teatro Municipal Vera Cruz.

apresentações de grupos de congadas e moçambiques nos feriados de 13 de maio, Dia da Abolição da Escravatura, e de 12 de outubro, Dia do Rosário;

Quem não se recorda dos Festivais de Catira da Casa do Folclore e das comemorações dos 50 anos de Encontro de Folias de Reis, realizado no Teatro Vera Cruz? O sucesso desses projetos se deve ao irrestrito apoio proporcionado pela Fundação Cultural, através de seu diretor cultural, Antônio Carlos.

Há que se destacar a abertura que ele proporcionou para as apresentações do Projeto Dandô, que já trouxe a Uberaba dezenas de violeiros de todos os rincões do Brasil e de outros países da América Latina. A disponibilidade do Teatro Experimental de Uberaba e do Memorial Chico Xavier foi essencial para o êxito da caravana musical.

O seu apoio como presidente da Fundação Cultural tornou possível a consolidação do programa, criado e patrocinado pela Associação Cultural Casa do Folclore, “Coisa Nossa de Uberaba”, que é transmitido pela TV Câmara.

Além da amizade que nos unia, das jornadas culturais que fazíamos, fomos também, por alguns anos, companheiros de conselho no Conphau.

Inesquecível também os projetos culturais dos quais Antônio Carlos, por sua própria iniciativa ou por dever de ofício, participou: as apresentações no Circo do Povo; a Escola Mirim de Samba, projeto social com as crianças dos bairros periféricos; Domingo Com Música, na Praça do Mercado; Domingo na Concha, na Concha Acústica; os carnavais de rua, a recuperação do TEU, onde foi diretor por cinco anos, tendo ali realizado o 3º FESTIMINAS – Festival de Teatro Amador de Minas Gerais.

Foi coordenador das oficinas de teatro, músicas, danças folclóricas, artesanatos e comidas típicas regionais, com o patrocínio do Ministério da Cultura.

Além de participar da organização de vários festivais de Música Popular Brasileira, Festival do Chapadão, Uberaba Canta, Festival da Canção Ecológica, trouxe, com Heloísa Piau, o projeto TIM ArtEducaação que através de oficinas teve o objetivo de incluir arte, cultura educação e ações sociais a diversas crianças e adolescentes.

Antônio Carlos deu apoio para as criações da Orquestra Municipal e da Orquestra Jovem, através da Fundação Cultural de Uberaba, que se tornaram exemplos nacionais, não só no aspecto cultural, mas, principalmente, pelo seu objetivo social.

Professor há quase 40 anos, Antônio Carlos Marques era formado em Jornalismo, Artes Plásticas com habilitação em Desenho, Artes Cênicas, Folclore e Música e pós-graduado em Lato-Sensu (Educação).

Como professor, lecionou na Escola Municipal Santa Maria, Escola Estadual Frei Leopoldo, Escola Estadual Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, Escola Estadual Nossa Senhora D’Abadia, Colégio Nossa Senhora das Graças, Conservatório Estadual de Música Renato Frateschi e, como professor universitário, na Faculdade de Ensino de Uberaba.

Como reconhecimento do seu trabalho foi homenageado, em vida, com seu nome dado à sucursal da Biblioteca Pública Municipal de Uberaba que funciona no CEMEA Abadia.

Antônio Carlos faleceu em 15 de junho de 2019. Ele deixou a esposa Elita de Fátima Ribela, e as filhas Thalita Ribela Almeida, Thaiana Ribela Almeida e Thaynara Ribela Marques.

Através de um importante logradouro público ou monumento a ser construído, seu nome será imortalizado e será sempre um exemplo para todos aqueles que carregam a bandeira da cultura popular.

Gilberto de Andrade Rezende – Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro. Presidente da Associação Cultural Casa do Folclore. Um dos fundadores e ex-conselheiros da Fundação Cultural de Uberaba e ex-conselheiro do Conphau.

Fontes: Prefeitura Municipal de Uberaba, Fundação Cultural de Uberaba e Jornal da Manhã.